29 de março de 2010

DANIEL - O SONHO ESQUECIDO

"Ora no segundo ano do reinado de Nabucodonozor, teve este uns sonhos; e o seu espírito se perturbou, e passou-se-lhe o sono." (Daniel 2:1)
Nabucodonosor lembra-se que teve um sonho, ele percebe de forma confusa que este sonho é importante, mas ele esqueceu o sonho. Há aqui um paradoxo. Se ele se esqueceu do sonho, como pode ele saber da sua importância e porque razão fica tão ansioso? Nabucodosor sabe que o seu sonho é importante porque o teve repetidamente. A palavra “sonhos” está de facto no plural (verso 1). Esta repetição do mesmo sonho é em todo o caso estranha, e o facto de o ter esquecido torna o rei mais desejoso e consciente que tudo deve ser feito para saber do que se trata, porque para ele, estão reunidos todos os ingredientes que confirma que este sonho é de carácter sobrenatural. A isto acresce uma outra questão: se Nabucodonosor recebeu o sonho repetidas vezes, e se ele percebeu a importância, como pôde tê-lo esquecido?
O esquecimento explica-se pelo facto de Nabucodonosor ter ficado ansioso, ou seja, o rei compreendeu que era uma mensagem dos deuses, mas esta revelação levou-o a um estado de recusa que o sonho se escondeu no esquecimento, evitando (inconscientemente) deste modo a realidade que ele percebe ameaçadora. Esta explicação de ordem psicológica é confirmada mais tarde por Daniel ao afirmar que este sonho foi dado afim de permitir a Nabucodonosor um melhor conhecimento de si mesmo: “para que entendesses os pensamentos do teu coração.” (Daniel 2:30.
A esta razão acresce uma outra, de ordem sobrenatural. Deus está na origem deste sonho e desta amnésia. O facto de não se recordar de um sonho no conceito babilónico era um sinal que prevenia: “Se um homem não se recorda do seu sonho, isto significa que o seu deus está em cólera contra o homem.” (Leo Oppenheim, Le rêve, son interpretation dans le Proche-Orient ancien, Paris, 1959). O carácter desta revelação é sublinhado por duas vezes pelos caldeus: “Não há ninguém sobre a terra que possa cumprir a palavra do rei; pois nenhum rei, por grande e poderoso que fosse, tem exigido coisa semelhante de algum mago ou encantador, ou caldeu. A coisa que o rei requer é difícil, e ninguém há que a possa declarar ao rei, senão os deuses, cuja morada não é com a carne mortal.” (Daniel 2:10,11), e ele chegam a reconhecer “senão os deuses, cuja morada não é com a carne mortal” (v.11). O que significa dizer que só uma revelação do Alto permitiria revelar o sonho ao rei. O próprio Daniel realça perante o rei: “O mistério que o rei exigiu, nem sábios, nem encantadores, nem magos, nem adivinhadores lhe podem revelar; mas há um Deus no céu, o qual revela os mistérios,” (Daniel 2:27,28).
De facto, este esquecimento deveria permitir ao rei e a todos os outros a prova que o seu sonho era uma revelação do Alto, e não o efeito de uma fantasia subjectiva. O seu sonho é certamente uma mensagem que lhe permitirá ter um critério objectivo, um teste que lhe permitirá julgar a qualidade da mensagem através dos candidatos que irão ser protagonista da interpretação do sonho: “se não me fizerdes saber o sonho, uma só sentença será a vossa; pois vós preparastes palavras mentirosas e perversas para as proferirdes na minha presença, até que se mude o tempo. Portanto dizei-me o sonho, para que eu saiba que me podeis dar a sua interpretação.” (Daniel 2:9).
Nestas circunstâncias, não havia nenhuma pista que permitisse a especulação sobre os dados. Nabucodonosor não se contentará de uma simples explicação astrológica de carácter profissional. Ele quer saber a explicação do sonho, a única que seja correcta. Não dá espaço para a diversidade de opiniões. A verdade implicada na revelação exclui o pluralismo, assim, não pode ser uma explicação qualquer. Tem que ser única e afirmativa. Em comparação com a revelação, todas as outras verdades só podem ser “palavras mentirosas e perversas” (v.9), um meio de “ganhar tempo” (v.8).
Nabucodonosor já tinha compreendido, e nestas circunstâncias actuais, mais claro ficava, que já tinha sido enganado noutras ocasiões. O rei passa da angustia natural a uma fúria de morte. De facto, é porque o rei tem medo que ele ameaça de morte. O crime e a cólera são frequentemente a expressão da angústia provocada pelo medo.
O carácter desmesurado do castigo a aplicar confirma este diagnóstico: Respondeu o rei, e disse aos caldeus: “Esta minha palavra é irrevogável se não me fizerdes saber o sonho e a sua interpretação, sereis despedaçados, e as vossas casas serão feitas um monturo.” (Daniel 2:5). Nabucodonosor não está a brincar, a ameaça não deve tomada com ligeireza. Os assírios eram conhecidos na Antiguidade pela sua crueldade. A prática que consistia em cortar os corpos dos seus inimigos em pedaços e a queimar as suas casas era normal na Mesopotâmia antiga. A cólera do rei teria efeitos terríveis, não pouparia ninguém. Dado que os caldeus (os sábios) são uns charlatães e mentirosos serão todos executados. Todos, inclusive Daniel: “saiu, pois, o decreto, segundo o qual deviam ser mortos os sábios; e buscaram a Daniel e aos seus companheiros, para que fossem mortos.” (Daniel 2:13).
O nosso próximo estudo será sobre a “Oração para que Deus desvende o segredo.” Estou ansioso para começar, vou deixar alguns dias para que todos os amigos leiam o tema que agora terminámos, eu não o perderia!
Um abraço.

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