18 de julho de 2011

DANIEL 9 (parte 1): FAZENDO O MELHOR PELOS OUTROS.

De mãos dadas com a mulher, o homem negro avança com nobreza até à saída da penitenciária. A imprensa e o povo comprimem-se na tentativa de o ver, acenando entre sorrisos confiantes. Os quase trinta anos de detenção não amenizaram as marcas de intrepidez no rosto de alguém que lutou pelo povo – uma luta pelo direito de voz e voto, de liberdade e cidadania, de justiça e igualdade para o homem negro. Era o fim do apartheid, regime que segregava desumanamente na África do Sul as pessoas de acordo com a sua etnia. As pressões internacionais aliadas às revoltas populares consolidaram a libertação de um dos maiores vultos do século 20: Nelson Mandela.

Ao longo da História, poucos homens abraçaram causas humanitárias com tanto destemor e abnegação como Mandela. Isso porque é natural a todos nós buscar aquilo que é de nosso interesse, ao invés da procura por interesses alheios. Por esse factor, a vida dos heróis que lutaram por seus países, povos ou grupos sociais emocionan-nos tanto.

Semelhante em disposição a Mandela, um estadista hebreu abriu mão dos seus interesses com o objectivo de dar priorioridade ao seu povo. Os judeus sofriam em exílio, inseridos numa realidade mais atroz do que a enfrentada por homens e mulheres negros contemporâneos de Nelson Mandela. Tendo servido na corte desde a época de Nabucodonosor, o profeta Daniel permanecia na política, mesmo após a substituição da dominação babilónica pelo comando do Império Medo-Persa. Na óptica do mensageiro de Deus, parecia que o cativeiro era interminável. Embora soubesse pelo estudo das profecias de Jeremias (Jr 29:10) que o exílio duraria 70 anos, Daniel sentia-se inseguro, uma vez que nada no seu horizonte apontava para o fim do cativeiro.

Uma possibilidade começou a desenhar-se na mente daquele estadista experiente: Será que o cativeiro não estava acontecer devido aos pecados do povo? Afinal, a própria razão de ser da condição dos judeus, arrastados para um país estrangeiro, tinha explicação na extrema rebeldia nacional, que os levara a rejeitar coletivamente a mensagem divina dada por meio de vários profetas, entre os quais contava-se o próprio Jeremias (2Cr 36:15-21). Se o comportamento rebelde da nação se repetisse, como Deus poderia abençoá-los?

Como pode notar, Daniel, a quem a Bíblia não atribui nenhum erro específico e que sempre procurou manter conduta exemplar, tinha motivos suficientes para criticar a postura dos seus compatriotas. Aliás, não é assim que agimos ao perceber erros na forma como a liderança da igreja actua? Não criticamos os organizadores quando o culto jovem fica aquém do esperado? Numa geração marcadamente influenciada pelo padrão de qualidade das emissoras de televisão, a exigência é constante. Temos uma percepção mais crítica em relação às actividades da igreja. Tendemos a criticar indivíduos por suas deficiências e fracassos. Esse espírito corrosivo, invariavelmente, volta-se contra nós mesmos, agindo como um ácido sobre a espiritualidade – já que a crítica aos que nos rodeiam tira o foco de nós mesmos, deixamos de ver a “trave” do nosso olho enquanto reparamos no cisco que invade a retina do próximo (Lc 6:42)…

Daniel, felizmente, tinha outra mentalidade; ele resolveu orar por seu povo. Não foi uma apressada oração antes do almoço – Daniel realmente orou! Ele jejuou e deixou de usar as finas roupas da realeza, passando a cobrir-se com um tecido áspero, além de lançar terra sobre a própria cabeça, em sinal de humilhação na presença do Senhor (Dn 9:3).

Por favor, não deixe esta cena passar despercebida: Daniel intercede pelo seu povo. Na sua oração, não há discriminação entre ele e Israel como um todo; os pecados são confessados em nome de um “nós” que engloba indistintamente Daniel e toda a comunidade da qual ele fazia parte. Que conceito equilibrado Daniel manifestou! Longe de qualquer sentimento de prepotência ou arrogância, ele inclui-se entre aqueles que necessitam de restauração espiritual (Dn 9:4-8).

Simultaneamente, o profeta e estadista revela um senso peculiar de dependência divina. A sua confiança na palavra de Deus confiada a Moisés praticamente dirige o raciocínio dessa comovente oração (Dn 9:11-13).

Quando a nossa disposição é orar em lugar de criticar, algumas coisas mudam, primeiramente em termos de suprimento relativo às necessidades que nós temos. Deus atende quando vê que não há egoísmo, mas altruísmo no coração que ora. Afinal, Ele sabe que, ao responder à prece do altruísta, a bênção se multiplicará, porque será repartida com outras pessoas. Não quer você também permitir que o Espírito Santo crie em si o desejo de interceder pelos anelos e urgências de outros? Deus o convida agora para olhar para algo maior do que o seu próprio umbigo – a mão estendida de quem carece do seu melhor.

(Douglas Reis, pastor e professor em Santa Catarina)

Pense e discuta:1. Cite pelo menos três atitudes que Daniel manifestou ao orar que podem ser aplicadas na sua vida hoje.
2. Que semelhanças encontra entre Daniel 9:3-19 e Neemias 1:4-11?
3. Só orar não basta! O que pode fazer de prático para ajudar a outros?
4. Já ouvi testemunhos que começam por descrever diversas tentativas humanas para resolver determinado problema; havendo todas elas fracassado, a pessoa afirmou que, naquele momento, havia decidido orar. Por que deixamos a oração para último? De que precisamos a fim de dar prioridade à oração na hora da crise?

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